A Despedida - Psicografia

 

A Despedida


Ouvia as rezas e os choros, mas não entendia por que choravam se era o meu corpo que doía. Mesmo dormindo sabia o que estava acontecendo. Ouvia e sentia tudo.

Já não aguentava mais o sofrimento, meu corpo estava tomado de dor, preso naquela cama, um entra e sai de médicos,  tomando muitos remédios.

Ouvia dizerem que os antibióticos para conter as infecções, que se espalhavam rapidamente, não faziam efeito. Diziam que teria sobrevivido a um acidente.

Eu não sentia minhas pernas. Elas não respeitavam mais os meus comandos. Pouco ficava acordado.

O tempo demorava a passar, Sabia que estava recebendo um tratamento. Mas o que havia acontecido?  Não via papai e mamãe, doía muito não ter ninguém conhecido comigo.

Somente a Dona Cida, uma vizinha amiga, ia me visitar. Ela chorava muito, não entendia seu sofrimento, não me trazia notícias e nem me falava onde estavam papai e mamãe, só falava que iria encontrá-los em breve.

“Em breve meu filho, eles estão te esperando...”.

Aquilo era um grande conforto para minha alma.

Até que um dia, acordei sem dor, sem nenhuma dor, nenhuminha mesmo. Estava em um novo quarto, mais simples, tinham me transferido. Acho que estava então curado.

Mas ainda não sentia minhas pernas. Tentei me levantar, mas elas não responderam ao pedido de movimento.

Mas se as dores passaram, as pernas logo estariam boas para que eu pudesse voltar a andar, correr, me movimentar. Não esperava a hora de voltar para a escola, encontrar meus amigos, minha professora.  Mas o que mais pedia naquele momento era ver papai e mamãe. Nem Da. Cida ia me visitar mais. Fiquei angustiado.

Uma médica entrou no quarto: “ Acordou Fabinho? Está com fome?”

Logo me trouxe pão e frutas. Começamos a conversar e perguntei onde estava papai e mamãe.

“Eles estão no quarto ao lado. Vão precisar de mais repouso. Mas logo estarão juntos.”

Fui levado para passear pelo jardim do hospital. Um senhor vinha todos os dias ver como estava e percorria, empurrando a cadeira de rodas, por todo aquele lindo lugar. Ele me lembrava alguém, mas não conseguia saber quem realmente era. Minha cabeça doía quando tentava pensar nisso.

Será que tinha morrido e estava no céu?

Se estivesse no céu veria anjos, estaria flutuando, não precisaria que Seu Manoel fizesse todo aquele esforço para me levar passear.

Chegava a esquecer que estava hospitalizado. Me despertava um amor tão grande. Além de muito engraçado ele me fazia chorar com suas histórias.

Cada vez sentia mais proximidade e amor pelo Seu Manoel.

E os dias foram passando e papai e mamãe ?

Numa manhã me levaram em uma sala onde pude ver por uma televisão papai e mamãe dormindo. Disseram que precisariam ficar lá por mais um tempo. Mas quanto tempo?

Foi quando me perguntaram se eu gostaria de ir morar com Seu Manoel, Vô Manoel para todos. Mas chamava se Seu Manoel, não era meu avô, eu tinha um avô já.

Seu Manoel falou que iria para sua casa, com mais quatro crianças. Achei maravilhoso.

Lá poderia estudar, aprender muitas coisas e quando papai e mamãe acordassem iriam me visitar.

Fomos, eu e Seu Manoel.

Chegamos em uma vila muito simpática. Várias casas. Algumas crianças correndo pela rua. Toda gramada e cheia de árvores.

Vô Manoel parou na entrada da vila e me disse “Fabinho, é sua nova casa, é aqui que irá morar.”

Aquilo tudo me deixava muito feliz. Meu coração explodia de alegria. Mas quando iria embora, quando encontraria Papai e Mamãe?

Vô Manoel me pegou no colo e disse: “ Estas pernas voltarão a ser suas um dia, aqui não precisará dela, vai aprender a caminhar sem elas.”

Já não me importava tanto. Só de não sentir mais aquelas dores todas, por estar naquele lugar lindo, tudo era perfeito.

Entrei então na casa do Vô Manoel, conheci o Ziquinho, o Jorginho, o Zé Pretinho e a Mariazinha, todos moravam com Vô Manoel. Ele cuidava das crianças que saiam do hospital e seus pais continuavam internados.

“Este é o Fabinho, vai ficar aqui na nossa casa por um bom tempo.” Todos foram muito legais comigo.

O Ziquinho me mostrou a minha cama. Dividiu alguns de seus brinquedos.

“Depois o Vô João vai te dar um carrinho novo, por enquanto pode brincar com estes meus também”

Ganhei uma pipa grande do Zé Pretinho. Toda azul.

“Vou te ensinar a soltar pipa Fabinho. Aqui nós somos irmãos.”

Comecei a sentir-me mais à vontade, ficar mais confiante, mas pouco entendia daquilo tudo. Ganhei presentes, uma cama.

Até que um dia o Vô Manoel me chamou para conversar.

Ele abriu na parede da casa uma grande tela e começou a passar um filme. Eu conhecia todos aqueles lugares, era minha casa, papai e mamãe. Eu também estava lá, como aparecia ainda como um bebezinho, no colo, se eu já tinha crescido e já tinha três anos?

E então me mostrou a cena do nosso acidente, eu papai e mamãe. Estava no banco de trás, deitado no travesseiro, quando ouvi um grito e assustei. Comecei a bater no teto do carro, enquanto o carro girava...

“Já é o suficiente Fabinho. Você, seu papai e sua mamãe sofreram um acidente muito grave. Eles morreram no mesmo instante do acidente.”

Eu não acredito que papai e mamãe morreram. Mas a Da. Cida disse que iria encontrá-los?

“E vai encontrá-los sim. Você sobreviveu, mas sua missão estava no fim. Você também não está mais vivo como antes, hoje você está num lugar, que chamamos de vilarejo espiritual, chamada de Vila dos Pretos Velhos de Manoel do Congo.”

Não entendi nada. E papai e mamãe?

“Vamos lá fora....”

 Eu quero ir com eles também. Não quero mais ficar aqui.

Vô Manoel me levou até a frente de sua casa e lá estavam papai e mamãe. Me abraçaram , choramos muito.

Naquele instante lembrei que não era mais quem eu achava que era.

Lembrei do dia que Vô Manoel se despedia para que eu voltasse para a Terra, reencarnar e teria uma curta missão. Lembrei que precisaria passar três anos com uma família com a missão de unir seus laços afetivos, transformar seu olhar para aquilo que é realmente significante em suas missões.

“E você cumpriu sua missão direitinho. Agora está de volta para trabalhar mais um pouquinho comigo e com todos os seus irmãos do nosso vilarejo.”

Papai e mamãe se despediram, poderíamos nos encontrar sempre que sentisse saudades. Iriam seguir sua missão em outro lugar, mas estaríamos sempre ligados pelo nosso coração.

Não doía mais me despedir deles.  Sabia que minha ligação era com Vô Manoel. Eu entendi tudo o que aconteceu.

Senti que o amor pelo Vô Manoel e por todos também era tão grande...

Vô Manoel me ensinou a fazer chá, a fazer banhos de ervas para limpeza espiritual, me ensinou a benzer. Comecei a estudar a energia dos corpos espirituais, a rezar e fazer vibrações de luz.

Entendi que precisaria ficar sem minhas pernas para poder caminhar na minha evolução espiritual, que elas não eram o motivo de eu não andar. Aprendi a flutuar.

O vilarejo tinha muitas casas, muitas crianças e muitos Vôs e Vós. Eu conhecia todos. Era uma família muito grande.

Um dia estava sentado na frente da casa do Vô, soltando minha pipa, enquanto todos corriam brincando na rua. E o Ziquinho sentou-se ao meu lado:

“Eu vim me despedir de você pequeno, estou voltando pra Terra. vou reencarnar. Torce por mim.”

Mas você vai nos deixar ? Então é assim aqui também? Quando amamos alguém podemos perdê-la da mesma forma que perdemos na Terra?

“Não perdemos Fabinho, somente caminhamos para cumprir aquilo que precisamos para evoluir. É como a erva que fazemos o chá, ela era uma folha, de uma árvore, que tinha as propriedades do chá, mas só vai cumprir sua missão de levar suas propriedades de cura se virar chá.”

Comecei a chorar. Ziquinho era um irmão mais velho, ele tinha 12 anos quando chegou na casa do Vô. Agora era a vez de ele ir. Estava triste pela distância que teríamos, mas torcendo muito para que ele fosse feliz na sua missão.

O vai e vem começou a ser mais comum. Muitas chegadas e despedidas.

Até que ouço uma voz muito conhecida.

Da. Cida, a senhora veio me ver aqui? Que felicidade. Não sabe como foram importantes as suas visitas e seus cuidados enquanto estava hospitalizado na Terra.

“Meu pequeno. Você não me esqueceu. Como estava com saudade de você. Desde que partiu senti muito a sua falta e se seus pais também. Nossas famílias sempre foram muito amigas.”

Mas a senhora também desencarnou?

“Sim, estou aqui. Sempre fui daqui. Estávamos lá e logo estamos aqui de novo.”

Era muita alegria ver Da. Cida. Como era a vida, novamente seriamos vizinhos.

Estava aprendendo a cada dia que viver era uma constante mudança de plano. Um pouco em um outro tempo em outro.

Acordei com muita fome. Pouco comíamos. Parecia que não era tão necessário comer. Não entendia por que, se na terra minha mãe brigava para comer.

Mas uma vontade de doces. De bala, de doce de leite.

“Quer comer docinhos Fabinho?”

Muito Vô. Eu acordei com muita fome de doces. Achei que não tinha doces aqui. Só nos dão frutas.

“Vou te levar para um lugar onde você vai trabalhar e poderá comer doces também.“

Trabalhar, nunca vi nenhuma criança de três anos trabalhar.

 “Você vai colocar em prática tudo que tem aprendido. A limpar os pontos de energia, a dar passes espirituais, a fazer benzimento. A levar embora a tristeza e colocar alegria naqueles que estão em sofrimento. A colocar esperança naqueles que não acreditam mais e não tem mais forças para cumprir a sua missão na Terra.”

Então vou trabalhar na terra?

“Sim. Hoje você vai só visitar uma pessoa que está encarnada. E eu vou te ensinar como trabalhar depois com ela.”

Foi quando o Vô Manoel me pegou pela mão e viemos para a Terra. Que lindo. Lembrei de quando morava aqui. Que alegria ver o outro mundo com os olhos de cá.

“Essa é uma casa espiritual. Aqui chamam de Umbanda, é uma religião.”

Sim Vô, o senhor explicou na sua aula. É uma religião que trabalha com as energias da natureza. Mas o que eu vou fazer aqui?

“Aquele é o seu mais novo tio aqui da Terra. Luisinho. Talvez não lembre dele.”

Não me lembro.

“Ele passou uma grande temporada conosco, antes de você desencarnar ele já havia retornado”

Eu me lembrava sim. Mas não sabia exatamente quem era. Parecia que via seu corpo diferente. Legal, e o que eu vou ter que fazer?”

“Nada, somente se aproximar dele. E quando estiver perto, seus corpos mentais se ligarão. E você conseguirá viver por pequenos períodos através do corpo dele. “

Mas se eu estou vivo e é só um outro plano, por que viver no corpo dele?

“ Porque para cumprir sua missão, precisa entregar aquilo que estuda no nosso plano, e a Terra é um plano onde os espíritos se desenvolvem sem a consciência plena de sua trajetória espiritual, pois só assim conseguimos medir a quantidade de evolução. A consciência criaria uma grande defesa e não daria mais sentido em transitar entre os planos. “

Mas ele me conhece?

“Sim, mas como disse, não tem consciência.”

Comecei a lembrar. Seu Zequinha agora era tio Luisinho.

“Fica aqui sentadinho. Vou te ensinar como se aproximar. Só observa.”

Quando vi o Vô Manoel estava dentro do Tio Luizinho. O Tio Luizinho estava fora do corpo dele que estava com o Vô Manoel. E eu não entendia mais nada.

“Você é o Fabinho?”

Eu sou o Fabinho. E você é o Tio Luisinho?

“Sou eu. O Vô disse que viria. Estou muito feliz que trabalharemos juntos.”

Mas eu não sei trabalhar. Pensei que iria comer doces.

“Mas vai ficar bem. Hoje vamos ter trabalho com Crianças. Vai ser seu primeiro trabalho aqui no terreiro. Não se preocupe em fazer nada, em falar nada. Faça apenas o que sentir. E aí o Vô estará ao seu lado e te dará mais orientações.”

Quando vi o Vô Manoel já não estava mais no corpo do Tio Luisinho, o Tio Luisinho já não me via mais.

“Você vai aprender meu filho. Me dê a mão que vou te ajudar”

E a partir daquele dia comecei a trabalhar na Umbanda com meu Tio e meu Vô.

Quando cheguei na nossa casa Vó Cida tinha preparado uma festa.

“Você começou a trabalhar e isso merece uma comemoração.”

Contei como tinha sido estranho. Como era diferente. Contei até que tinha comido muitos doces.

Demos muita risada e todos festejaram comigo este momento muito especial na minha caminhada.

Os anos na Terra foram se passando. A cada dia eu e o Tio Luisinho nos fortalecíamos e despertávamos um amor de pai e filho. Ele me dava a oportunidade de cumprir a minha missão e eu a dele.

Eu passei anos muitos felizes .

“Fabinho, você vai ter que seguir sua missão. Mas desta vez será na Terra.”

Mas Vô Manoel, agora que estamos trabalhando, sou feliz aqui na sua casa. Tenho a casa do meu Tio para trabalhar.

“Mas esse foi seu tempo aqui. Você vai aprender a caminhar, agora com suas pernas, num novo corpo, numa nova família.”

E a festa que meu Tio fará para mim? Ele disse que faria tudo o que eu quisesse. Bolo, pipa, bala mole, doce de leite?

“Essa será a despedida dele com você, neste plano. “

Fiquei muito triste. Perderia todos novamente.

Aí me lembrei de quando o Ziquinho veio se despedir e me disse :

“Não perdemos Fabinho, somente caminhamos para cumprir aquilo que precisamos para evoluir.”

Então está bem. E eu vou ganhar minhas pernas novamente. Vou poder correr.

Me despeço agradecendo por tudo que fez por mim, por tudo que me proporcionou nestes longos e ao mesmo tempo curtos trinta anos.

Eu cheguei com três anos e hoje ainda com meus três anos eu deixo este plano, mas aprendi dez vezes mais, aprendi muito mais que os trinta anos de convivência que nossa missão nos proporcionou.

E você Tio  só cresceu, te vi perder medos, abrir mãos de coisas para conquistar outras. Hoje tem mais consciência e responsabilidade o que me faz feliz por saber que estivemos este tempo todo juntos. Tenho muito orgulho de você. Sei que ainda tem muito no seu caminhar. Torço por você.

Agora preparado para seguir.

E vou correr, porque chegou a hora de recolherem meu espírito, vou passar um período despolarizando minha mente, preparando -me para nascer em um novo corpo.

Mais uma vez, Obrigado e em breve nos encontramos.

Torce por mim. Te amo.


Fabinho






















( Imagens da Festa    de  São Cosme e Damião, despedida do Fabinho. Cheio de Pipas, com bolo, doces, guaraná e cheio de crianças felizes).


Psicografia recebida em: 24 de Outubro de 2021.

Espirito: Fabinho

Médium: Luís Guilherme Campos Santos

21 comentários:

  1. Ah, o amor nos une a todos nos caminhos do progresso que conduzem ao Criador!
    Todos torcemos por você, Fabinho!

    ResponderExcluir
  2. Obrigado por fazer parte dessa família! Que a luz, a humildade e a sabedoria sempre nos acompanhe no caminho do bem!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Axé, você é muito importante pra nossa família e sua força mais a força de todos nos faz assim... gratidão

      Excluir
  3. Fabinho cumpriu sua missão, ajudou aos irmãos necessitados trouxe alegria a muitos corações aflitos. Segue a Luz e seja muito feliz na sua reencarnação 💙

    ResponderExcluir
  4. Que lindo, o espiritual é sensacional. Gratidão por compartilhar������

    ResponderExcluir
  5. Obrigado Luis por dividir, tive a honra de conhecer o Fabinho.

    ResponderExcluir
  6. ��������

    ResponderExcluir
  7. Que história! Me emocionei demais... Obrigada por dividir algo tão lindo. Parabéns pelo trabalho incrível que faz. Fabinho é um doce de menino e com certeza logo estará próximo novamente, desta vez encarnado... Vocês tem uma conexão linda!!

    ResponderExcluir
  8. Que lição, pra entender tanta coisa, nossos sentidos com a vida e com a morte. Obrigado Luis por dividir, a sua benção.

    ResponderExcluir
  9. Só choro aqui. Que luz meu irmão. Viva o Fabinho, segue seu caminho e brilha.

    ResponderExcluir

Obrigado pelo seu comentário. Assim que possível retornaremos a sua solicitação.

Axé !!!!